Diálogos no país das laranjas

Dizia a formiguinha para a cigarra: Ó cigarrinha vamos todos virar laranjinhas. A cigarra pegando na sua guitarra disse-lhe assim: Mas ó formiga tu não vês que a laranja está podre? Tu não estás mesmo a ver que se o fizermos corremos o risco de deixar de pertencer ao reino animal e passarmos todos a ser uns simples vegetais alaranjados?
Não faz mal, disse a formiga, assim passamos a ter laranjas para dar e vender, podemos até passar a exportar e o país irá de vento em popa.
És mesmo cretina, disse a cigarra, então tu não sabes que os gajos só lá querem laranjas normalizadas? Tu não sabes que as nossas laranjas cá são todas umas anormais? Ninguém as vai querer, temos que ser nós a ficar cá com elas. Além disso temos muitas laranjas, como o Luís Delgado, o Pacheco Pereira, o próprio Marques Mendes que, espremidas, espremidas, nem deitam sumo.
Olha o caso do Durão Barroso. Aquilo é que foi uma laranja que subiu na vida. Começou por ser um mero maoista de cabelos compridos e lá está ele à frente dos destinos europeus.
Mas tu és mesmo burra, ó formiga, então não se vê logo que aquilo é uma laranja passada? Olha o exemplo que tu foste buscar, nem os burros a comiam.
Lá estás tu. E então o nosso candidato que chegou a presidente. Nasceu no laranjal de Boliqueime, começou por baixo, apanhou umas taponas do pai que não era para graças, fez-se doutor em Finanças, foi PM, professor na Universidade Caquética, escreveu livros e chegou ao topo, agora é presidente de Portugal.
Tu acreditas em tudo que ouves. Então tu não sabes que o animal nasceu em Boliqueime mas nunca foi descalço ao petróleo? Tu julgas que ele era pobrezinho, do povo, e que subiu na vida à custa de um grande esforço? Qual quê, essa laranja podre sempre teve criados em casa, o pai era industrial da alfarroba, era um patrão bota-de-elástico que produziu a laranja mais mirrada e amarga que alguma vez se viu.
Olha cigarra, tu estás sempre a dizer mal, um dia ainda te arrependes. Eu se fosse a ti transformava-me numa laranja como as outras antes que comeces a dar nas vistas e a olharem-te de lado. Ficou provado que vivemos no país das laranjas. É melhor realizares a metamorfose quanto antes, assim pode ser que ainda apanhes umas laranjas no prazo de validade. Olha que o que vai haver mais por aí são laranjas podres, dessas que até cheiram mal e ninguém as quer. Apressa-te, apressa-te, ainda está a tempo de dizer que votaste no Cavaco.